“É na figura do educador e da família que ainda temos a memória do que representam a humanidade e o ser humano”.
Ricotta
Diante do que podemos chamar de modernidade líquida e em tempos de quarta revolução industrial, nos quais as relações humanas estão imersas no contexto das tecnologias e da disrupção dos domínios físicos, digitais e biológicos, nos questionamos: qual é o papel do educador, aqui e agora, na co-construção da dimensão do Ser?
Como podemos contribuir com o toque de humanidade para que as relações não se percam no vazio e nas carências afetivas não supridas com o Ter?
Ricotta há quase vinte anos nos aponta uma dica preciosa, que sejamos interlocutores capazes de dar forma ao Ser, contribuindo com a cultura específica do grupo que nos inserimos, com nossos valores e princípios. Dessa maneira, é preciso pensar na adoção de valores positivos já que tais condutas repercutem no modo de viver, pois se é na relação que adoecemos e também nela que nos curamos, como afirma Moreno, é urgente um olhar acurado para a relação educador-educando que necessita manter vivo o valor da humanidade e do ser humano que está envolto em uma realidade virtual fortemente presente no nosso aqui e agora.
Como educadores percebemos que a falta de equilíbrio entre o Ser e o Ter nos levaram a carências muito bem definidas no ambiente educacional, tais como a exclusão de pessoas, discriminações raciais e sociais, descuido com o espaço físico, falta de vínculos e respeito nas relações. Tais carências são sintomas do empobrecimento das relações, que por sua vez são decorrentes dos distanciamentos afetivos, tanto escolar como familiar.
Embora as crianças e jovens possam enfrentar dificuldades emocionais e de relacionamento em suas famílias, é papel da escola oferecer espaços seguros para que eles se sintam acolhidos e pertencentes. Portanto, a qualidade das relações no ambiente escolar é fundamental, proporcionando momentos para expressão e escuta, o que contribui significativamente para o desenvolvimento emocional e intelectual dos alunos.
Segundo Ricotta, “o não desenvolvimento do Ser gera “delinquência”, um grito em nome da necessidade de ser visto, de sentir-se preenchido e que não encontra em si ressonância”. Em um encontro permeado pelo diálogo, pela busca de questionamentos, de pensamento crítico, de afetos e emoções, é possível usufruir dos aspectos positivos desse momento histórico, sem nos perdermos de nós mesmos.
Ainda como caracteriza Edgar Morin, o dever principal da educação é de armar cada um para o combate vital pela lucidez. Nessa perspectiva psicodramática, podemos inferir que o horizonte da educação está em co-construir na relação, no aqui e agora, o combate vital pela espontaneidade-criatividade. Este caminho pode nos dar a consciência de quem somos,
em nossa essência, sem nos perdermos nas conservas disseminadas nas mídias, na inteligência artificial e nas mais diversas tecnologias disruptivas. Lembrando que para Emerson Merhy, são as tecnologias leves, aquelas das relações e afetos que permitem os processos de humanização.
Texto inspirado pelos capítulos 15 e 17 do livro Valores do Educador, escrito por Adailza Barbosa, Gabriela Zinn, Regina Pissinato e Patrícia Ferreira.